Mari (PB), 67 anos: uma história de lutas, tragédias e transformações
IMAGEM: A "família Luna Freire" está presente em Mari, Paraíba, especialmente através da história do povoado de Araçá, que teve seus primeiros moradores com o sobrenome Luna Freire no início do século XX, conforme relatado no livro "Araçá dos Luna Freire".
Sessenta e sete anos depois, a cidade carrega em sua memória uma trajetória marcada por disputas políticas, conquistas sociais e episódios que atravessaram a história nacional.
Foto: Epitácio Dantas da Silva Cordeiro nomeado primeiro prefeito, exercendo o cargo entre 1958 e 1959 /Reprodução acervo do artista plástico Júnior Pintyartes
Logo após a emancipação, Epitácio Dantas da Silva Cordeiro foi nomeado primeiro prefeito, exercendo o cargo entre 1958 e 1959. Pouco tempo depois, o município realizou sua primeira eleição direta. O escolhido foi Pedro Leite Filho, representante da UDN – União Democrática Nacional, partido conservador e opositor histórico de Getúlio Vargas. Pedro Leite governou de 1959 a 1963, consolidando o primeiro ciclo democrático da nova cidade.
Foto: Pedro Leite Filho governou de 1959 a 1963, consolidando o primeiro ciclo democrático da nova cidade/Reprodução acervo do artista plástico Júnior Pintyartes
Mas seria no governo seguinte, entre 1964 e 1968, que Mari viveria um de seus episódios mais marcantes. Sob a administração de Pedro Tomé de Arruda, a cidade assistiu à explosão das Ligas Camponesas, movimento que mobilizava trabalhadores rurais em defesa de seus direitos. No dia 15 de janeiro de 1964, um conflito sangrento entraria para a história: durante uma disputa de terras do usineiro Nezinho de Paula, policiais e jagunços abriram fogo contra camponeses. O presidente do sindicato, Antônio Galdino, foi metralhado. O episódio ficou conhecido como "A Tragédia de Mari" e ecoa até hoje como símbolo da violência contra o movimento rural no Brasil.
Foto: Pedro Tomé de Arruda governou entre 1964 e 1968/Reprodução Portal Umari
Na mesma década, José Martins de Lima assumiu a presidência do Sindicato dos Trabalhadores Rurais — figura central na organização das lutas camponesas em Mari. Segundo registros locais, José Martins manteve papel ativo ao longo dos anos. A partir da década de 1970, ele ingressaria na política, iniciando uma dinastia no Legislativo que se estenderia até seu neto, José Martins Neto, mantendo a influência familiar por décadas. Até 2025, José Martins continua como referência na defesa dos trabalhadores do campo.
Apesar das tensões sociais, o governo de Pedro Tomé também foi lembrado por obras de infraestrutura que marcaram o município: matadouro público, estádio de futebol, escola e posto de saúde. Além de prefeito, Pedro Tomé se consolidou como patriarca de uma família que por décadas teve influência na política mariense. Seu filho, Eudes Arruda de Barros, também se tornaria prefeito; e sua filha, a professora Dirinha Arruda, ocuparia cadeira na Câmara Municipal, chegando à presidência do Legislativo local.
Foi ainda nesse período que a cidade enfrentou uma epidemia de erupções cutâneas, febre e fraqueza que dizimou parte da população. Na busca por alívio, os moradores recorreram à fé e a São Sebastião, que passou a ser cultuado como protetor da cidade. Curiosamente, o santo só foi reconhecido oficialmente como padroeiro de Mari em 2025.
De 1969 a 1972, o comando coube a José de Melo, período em que Mari viveu a chamada “época de ouro da agricultura mariense”. Apesar de não ter uma vida social intensa na cidade, a família Melo teve participação marcante nos destinos do município. José de Melo exerceu dois mandatos como prefeito; seu filho, Sérgio Melo, anos mais tarde, seria vereador e presidente da Câmara Municipal; e sua nora, Karina Melo, assumiria o cargo de vice-prefeita.
Foto: José de Melo governou entre 1969 e 1972/Reprodução acervo do artista plástico Júnior Pintyartes
Na sequência, entre 1973 e 1976, o prefeito foi Eudes Arruda de Barros, herdeiro de um sobrenome influente. Filiado ao MDB, venceu as eleições e marcou sua gestão pela inauguração da Fundação Santa Cecília, hospital filantrópico que se tornaria referência regional.
A instituição foi fechada na década de 2010 e, atualmente, permanece desapropriada por meio de decreto do governo da atual prefeita Lúcia de Fátima Santos. Até hoje, historiadores debatem o real peso do dinheiro público investido na Fundação.
Já em 1977, assumiu a prefeitura José Paulo de França, que abriu sua administração com foco declarado na educação, apontando novos rumos para o desenvolvimento do município.
📌 Esta reportagem integra uma série especial do original Paraíba 2.0 sobre os 67 anos de emancipação política de Mari. Esta primeira parte revisita as duas primeiras décadas — de 1958 a 1978. As próximas edições abordarão os períodos seguintes até os dias atuais.